domingo, 20 de março de 2011

Estrangeiro

-Nossa!Você viu isso? Essa reportgem aqui?
-Qual, a sobre culturas? Dei uma olhada sim, por que?
-Você viu quantas tradições primitivas, arcaicas e ridículas há nos países? Tipo, você sabia que em certas tribos africanos as mulheres mais belas são aquelas que alongam o pescoço a ponto de pôr vários anéis nele? Os cientistas dizem que isso pode até matá-la, caso a mulher tire os aros...
-É, eu vi isso... só que tem outros ainda... por exemplo, uma certa tribo amazônica faz o rapaz maior de idade pôr suas mãos em potes cheios de formigas-de-fogo furiosas e aguentar a dor das picadas para provar que é homem já, e homens de outra tribo da Nova Zelândia pula de uma torre de mais de quinze metros presos por apenas um cipó, arriscando suas vidas!
-É... e sem falar em hábitos um tanto estranhos... que nem aquela mania hindu de não comer vacas e se lavar nas águas nojentas do Ganges, ou então a proibição judaica quanto ao consumo de carne suína. Eles deviam mais se preocupar com a guerra no país deles, e não com isso!
-Ah, e lembrei de mais uma coisa! E quanto às touradas espanholas? Hahaha, nunca vi um espetáculo tão deprimente! Principalmente nesses tempos de proteção ambiental e animal. E dizem que os países europeus são muito desenvolvidos...
-Ainda bem que nossa nação é desenvolvida! Vamos aproveitar isso e ver aquele desfile das modelos maravilhosas que temos, embora digam que elas têm uma certa doença psicológica lá... e falando em mulheres gostosas, sabe o que meu filho disse pra mim ontem? Ele foi numa “festinha”, haha, e conseguiu pegar geral sem camisinha! Agora eu posso chamar ele de homem!
-Ah, vamos. Vamos aproveitar que estamos perto do Natal, o nascimento de Jesus. Já matei tudo o que precisava para comemorar essa data linda! E que tal depois irmos à uma casa de strippers? Disseram que lá não há vergonha nenhuma...
-Nossa, é por isso que eu digo: nosso país é maravilhoso, principalmente quando comparamos nossos hábitos!

domingo, 13 de março de 2011

Black Swan

Inspirado no filme homônimo, Black Swan (Cisne Negro)

 Acabara suas tarefas, e agora sua mãe lhe deixara fazer algo pra distrair-se. Olhou ao seu redor. Por algum motivo (e custava para descobrir a razão) seus brinquedos de cinco anos atrás não a atraíam mais. Ligou a televisão então.
 Incrivelmente, havia apenas a mesma cena em todas as emissoras. Quer dizer, não a mesma, mas quando se trata de determinadas situações tudo acaba convergindo para o mesmo plano. Deveria, mas não queria para de ver. E viu.
 Depois encontrou uma pena negra no chão.
 Dias depois, saiu com suas amigas. Foi engraçado. Todas sedutoras, impertinentes, independentes, e ela ainda infantil, subserviente e sob os cuidados da mãe. Igual a uma ave. Mas ali não queria saber disso. Se divertiu, as amigas lhe “ensinaram” a seduzir, dançou um a dança nunca dançada antes, com movimentos impensados e hipnóticos, bebeu não apenas o líquido de Dionísio como também a bebida dos russos e outras mais. No fim da noite, suas companheiras lhe parabenizaram.
 Depois encontrou um pequeno amontoado de penas negras na mesa.
 E continuou experimentando novas sensações e ações que sempre haviam sido proibidas pelos seus pais anos e anos e anos a fio.
 E após a conclusão de cada ato, encontrava amontoados de penas negras no chão.
 E finalmente começou a pensar. Em tudo. Sobre tudo. Do porquê de tudo.
 Por que a sociedade prega a subserviência? Apenas os que obedecem estão certos? Será que é para garantir a ordem?
 Talvez esse não fosse o motivo. Pessoas que desde pequenas são submissas são mais fáceis de serem controladas depois, por aquelas figuras tããããããão respeitosas e respeitadas. Na verdade, essa obediência hereditária acaba sendo uma preparação para o meio de alienação do povo. Alienação, criada sem querer nas famílias para ser muito bem recebida na sociedade conservadora religiosa.
 Encontrou uma asa negra em seu braço.
 Por que todos dizem desejar a castidade, a inocência? Por que todos acabam sendo hipócritas ao valorizarem uma coisa, mas quererem realmente outra? Por que todos exibem socialmente uma imagem à qual seu verdadeiro eu não condiz?    
  É estranho realmente. Todos erram. Mas todos acabam escondendo seus erros. Acaba até sendo engraçado como muitos homens dizem querem casar com uma mulher virgem, mas se dedicam ao máximo para conseguir fazer sexo com o maior número de pessoas possível. É cômico ver que durante o dia a mídia exalta o puro e o intocável, mas à noite muda sua posição e passa músicas, histórias, e agora até um filme sobre uma garota de programa, vejam só. Chega ao ponto de divertido. Todos elevam o Cisne Branco às maiores altitudes – apenas para depois matá-lo e adorarem ao Cisne Negro.
 E encontrou o Cisne Negro no lugar de seu corpo.
 Agora estava certa. Completa. Perfeita. Era quente e frio, luz e sombra, pureza e sedução. Era agora o Cisne Branco e o Cisne Negro, sem a hipocrisia social.
 Agora ela estava louca. Agora ela pensava.